Eu conheci
uma garota, e ela passou por mim algumas vezes, como uma brisa, leve e quase
imperceptível.
A
verdade é que mesmo vendo-a, quietinha, por perto, eu não quis olhar.
Mas ela
veio pra mais perto, e quando assim se aproximou eu preferi olhá-la com olhos
maternos, com olhos de quem acolhe - por subestimação.
Sim, eu
tenho ainda muitas armadilhas no percurso entre o que eu sinto e o que eu digo.
Eu a
acolhi, e ela me beijou.
Eu
emudeci. Calei com a boca úmida, com as mãos trêmulas e o coração machucado.
Ela, no
auge dos seus dezenove anos fez-me encarar os meus fajutos vinte e quatro.
Ainda
encontro-me (quando encontro) tão despedaçada, tão frágil, como uma boneca de
porcelana.
Ela
disse, por mais de uma vez, admirar a minha força. E quando olho no espelho eu
procuro essa força para além dos cabelos raspados.
Seu
sorriso é um sorriso de esperança, o sorriso de quem ainda crê. Esse sorriso me
assusta, é cru.
Cigarro
entre os dedos, e na boca, por tal, a vaga lembrança do gosto da saliva de uma
garota que beijei aos quinze anos.
Marcas
de um passado recente por todo o corpo, fazendo-nos lembrar de que a vida fere,
machuca, sangra, até mesmo na pele macia de uma bela garota.
E esses
conturbados dezenove anos põe meus vinte e quatro em unidades, sinto-me aos
dois, sinto-me aos quatro, sinto-me dissolvida, e com saudades de quando eu
desenhava na tela em branco da cabeça os tão distantes vinte e tantos.
Os
tantos estão por aqui, rodeiam-me, puxam-me os pés ao anoitecer e tiram-me o
direito de chamar por meu pai quando o medo é indissolúvel.
Hoje,
exatamente agora, eu choro. Choro o choro da menina de quinze anos, a menina
que amou como quem morria, que odiou como quem amava, que fez de tudo um pouco
de si e que transformou em poesia toda esse caos. Vandalizou as palavras,
arrancou do peito cada letra, e passou noites a fio traduzindo a língua
estranha de seus monstros.
É pra
essa menina, que talvez soubesse muito mais do que eu como estar nessa vida,
que eu peço perdão.
Perdão
pela subestimação, pela vergonha que eu senti, pelas tantas vezes que te anulei
e te calei por ser uma garota de quinze ou dezesseis.
Você
foi parte complementar e essencial pra nós.
E
deixa-me contar-lhe um segredo – que fique entre nós -: Eu ainda não sei
entregar meu corpo a outrem sem que eu esteja entregue a mim primeiro. Travo.
Choro. Calo.
E
espero que sinta orgulho de mim, pois, hoje, eu não tenho medo de dizer não.
E eu
não vou enganar a nós e nem a nenhuma garota, tão pouco a menina dos dezenove de pele macia.
Eu
direi à ela que ainda não estou pronta pra dar passos sem bambear, de andar em
linha retas. Preciso, de quando em quando, me encasular, ter medo e chorar.
Caminharei
ao lado dela, de mãos dadas, se assim ela quiser. Mas não mais direi que sou o
que não sei se sou, ou que posso aquilo que ainda busco saber o que é.
Não
tenho vinte e quatro, tenho um tempo, um coração imenso, sensível, e olhos
sempre úmidos.
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